domingo, 22 de agosto de 2010

Ontologia na filosofia de Aristóteles

O entendimento da visão de Aristóteles sobre ontologia merece uma discussão mais detalhada, devido à sua grande influência, tanto na ciência da computação, quanto na ciência da informação. Na ciência da informação, esta influência se faz notar nos fundamentos teóricos da área, como, por exemplo, o uso de categorias na teoria do conceito de Dahlberg e na classificação facetada de Ranganathan.




Aristóteles de Estagira nasceu em 384a.C. na cidade de Estagira que ficava em Calcídica. Por volta de 367 ou 366 a.C. chega em Atenas e se matricula na Academia de Platão freqüentando-a cerca de vinte anos. As obras de Aristóteles podem ser consideradas sob dois tipos de composição: as destinadas ao público em geral, sendo esta mais dialética; e as destinadas aos alunos do Liceu, sendo escritos filosóficos ou científicos. As obras de Aristóteles contemplam várias áreas científicas, mas boa parte do material escrito se perdeu. Dentre as que restaram, a que está relacionada com o estudo presente é o tratado denominado de Categorias. Nela Aristóteles apresenta dez categorias básicas para classificar tudo o que existe. Ou seja, as categorias de Aristóteles revelam sua visão ontológica do mundo. Segundo García Morente (1964) as descrições das dez categorias propostas por Aristóteles são as seguintes:



• Substância - seria o que se pode dizer que algo "é" . Pode-se considerar a substância o que se diz de algo e isto é ele. Por exemplo: este é o homem, este é o gato, etc.



• Quantidade - pode-se dizer "quanto é", se é muito ou pouco. Por exemplo: um homem é pequeno ou grande, etc.



• Qualidade - pode-se dizer "que é". Por exemplo: é azul, bonito, etc.



• Relação - pode-se considerar uns seres em relação aos outros. Por exemplo: de um ser pode se predicar que é menor do que o outro, igual a outro, etc.



• Lugar - pode-se ante um ser determinar onde está. Por exemplo: está lá, em Paris, etc.



• Tempo - pode-se predicar "quando é", quando deixa de ser, quando foi. Por exemplo: século XX, é agora, etc.



• Ação - pode-se dizer "aquilo que aquele ser faz". Por exemplo: ato da semente que germinar.



• Paixão - pode-se dizer o que ele padece, sofre. Por exemplo: o gato é morto, etc.



• Posição - pode-se dizer sobre a posição do ser. Por exemplo: está em pé, sentado, etc.



• Estado - pode-se dizer sobre o estado do ser. Por exemplo: está florescido, seco, etc.



A primeira categoria é a substância que é a categoria mais abrangente e sobre a qual gira qualquer afirmação. As duas últimas categorias, "Posição" e "Estado", não aparecem em algumas passagens, e parecem ter trazido dificuldades de caracter lógico e metafísico para Aristóteles. Para exemplificar o relacionamento entre os fatos de uma instância do mundo e as categorias aristotélicas pode-se usar o exemplo fornecido por Russell (2001), que descreve uma situação envolvendo Sócrates:







FIGURA 6 – Exemplo do relacionamento entre fatos e categorias.

FONTE - RUSSELL, 2001, p. 118.



Segundo Sowa (2000) o filósofo vienense Franz Brentano organizou as categorias de Aristóteles na forma de árvore, onde as categorias são os nós folhas e cujos ramos são rotulados por termos retirados de trabalhos de Aristóteles (FIG. 7).







FIGURA 7 – Árvore de Brentano para as categorias de Aristóteles

FONTE - SOWA, 2001.



4.2.2.2 Influência da filosofia aristotélica no âmbito dos tesauros

Como foi visto na seção sobre a gêneses dos tesauros, estes evoluíram de listas de cabeçalhos de assunto até os tesauros baseados em conceitos. Os tesauros baseados em conceitos se fundamentam na Teoria do Conceito (TC). No preparo deste tipo de tesauro, após a seleção dos termos relevantes de um domínio utiliza-se como base as categorias formais da TC para iniciar a classificação dos termos. As categorias propostas pela TC baseiam-se nas fornecidas por Aristóteles. A FIG. 8, retirada de Campos (2001), mostra a correlação entre as categorias de Dahlberg e de Aristóteles.







FIGURA 8 - Correlação das categorias de Aristóteles com as categorias de Dahlberg

FONTE - CAMPOS, 2001, p. 131.



A influência da filosofia de Aristóteles também pode ser observada no método de análise da TC. Aristóteles entendia que o homem conhecia os objetos e sua estrutura a partir das sensações. As sensações são o ponto de partida para que o homem reproduza como resultado da atividade intelectual, conceitos. Os conceitos seriam inerentes à estrutura mesma dos objetos e não idéias transcendentais do mundo físico. Assim o homem, por meio de observações que se repitam de casos particulares, poderia a partir de uma operação intelectual, generalizar. Por exemplo: o conceito "gato" pode existir na mente humana como resultado, por via indutiva, da observação de vários seres concretos da mesma espécie. Aqui se percebe uma relação com o trabalho de Dahlberg que mostra também em sua teoria a possibilidade de se chegar a um entendimento ou uma classificação de um conceito a partir da indução e dedução.



4.2.2.3 Influência da filosofia aristotélica no âmbito da inteligência artificial

A contribuição mais óbvia da filosofia aristotélica para a IA é a lógica. A lógica é uma disciplina iniciada com Aristóteles com o propósito de garantir a veracidade das deduções. Até o século XVII a lógica não sofreu grande evolução, sendo que, somente com os trabalhos de Leibniz (1646-1716) e de Boole (1815-1864), a lógica foi modificada. O objetivo desses estudiosos era a formalização da dedução matemática, originando assim a Lógica Matemática. Outros pesquisadores contribuíram para a lógica matemática ter atingido a sua forma atual. Dentre eles pode-se destacar: G. Frege (1848-1925), B. Russell (1872-1970), N. Whitehead (1861-1947), Peano (1858-1932), D. Hilbert (1862-1943). Segundo Enderton (1972), a lógica matemática é "um modelo matemático do pensamento dedutivo". Já Quine, em seu livro A filosofia da lógica (1970), diz que a lógica é o "estudo sistemático das verdades lógicas".



O formalismo lógico é atraente porque sugere imediatamente uma maneira poderosa de derivar novos conhecimentos a partir dos antigos: a dedução matemática. Deste formalismo podemos concluir que uma nova frase é verdadeira, provando que ela é consequência de declarações já conhecidas. Assim, a idéia de uma prova, conforme desenvolvida na matemática, como uma maneira rigorosa de demonstrar a verdade de uma proposição em que já se acreditava, pode ser ampliada para incluir a dedução como uma maneira de derivar respostas a perguntas e soluções de problemas. Devido a este fato a Lógica é utilizada por muitos pesquisadores de IA para a representação e dedução de conhecimentos.



Outra contribuição possível da filosofia aristotélica para a IA seria o uso das categorias para organização dos conceitos registrados nas bases de conhecimento, similarmente ao uso de categorias no desenvolvimento de tesauros. No entanto, a contribuição do aspecto ontológico somente nos últimos anos tem sido considerada e, mesmo assim, de forma diferente da indicada pela filosofia, como é ressaltado nos trabalhos de Valente (1996) e Guarino (1998).



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